Texto: Apenas uma garota no trem


Gosto de olhar para a janela e observar as pessoas. Suas expressões, seus rostos, suas vidas. Imagino se elas são mais felizes, se elas sentem o mesmo que eu, se algum dia virão a sentir. Imagino nomes, histórias e finais felizes do jeito que quero. Talvez seja minha forma pessoal de me consolar. De fechar os olhos e fingir que não estou sentindo o que estou agora. Esse vazio. Essa sensação de que minha vida se perdeu e eu não sei o exato momento que comecei a deixa-la ir ladeira abaixo. Talvez seja pra ser assim e isso me consome cada vez mais um pouco. Fico pensando onde estarei quando essas coisas me consumirem por completo. Estou tentando superar. Tentando achar um propósito nisso tudo e ai repito pra mim mesma que vou parar com isso. Mas no final? Acabo insistindo de novo e de novo. Parece que não consigo parar. Foge ao meu controle. Quase todas as vezes que fecho os olhos posso ver as imagens da minha vida no passado. Quando eu era feliz, ou pensava que era. Agora, já não faz mais tanta diferença. E toda vez que eu olhava por aquela janela, eu me via em uma mulher que nem ao menos conhecia. Me ligava a ela. Me fazia sentir do mesmo jeito que eu me sentia antes. Me fazia me sentir de um jeito que eu não sinto faz tempo e que sinto falta desesperadamente.  

Não quero ser esse tipo de pessoa sabe? Sei o que as pessoas pensam. Está estampado na cara delas toda vez que me sento no mesmo lugar e observo as coisas pela janela. Está bem ali quando elas me lançam olhares entristecidos e até poderia dizer que de pena. É como se talvez elas soubessem o que estou passando, o que estou sentindo. Isso me incomoda porque ninguém pode imaginar como é. Como me senti, o que passei. O que aconteceu depois de eu ter meu coração quebrado. Depois de eu ter caído na real de que as coisas nunca poderiam voltar a ser como eram. Não, da mesma forma. E ai me pego chorando ou divagando no meio da noite, no meio do dia. Já nem tem mais um momento certo. Chego a me entorpecer para não sentir, não lembrar, não seguir em frente mesmo precisando. Tudo que eu tinha foi tirado de mim. As vezes vago pela rua, passo pelas pessoas ao meu redor. Passo pela vida que eu costuma ter. E desejo ardentemente tudo de volta. Sinto raiva, sinto ódio e sinto vontade de arremessar qualquer coisa que estiver a minha frente. Quero que isso acabe. Quero que todas essas lembranças possam ir embora. Eu não sou a mesma garota que eu já fui um dia. Não sou aquela garota cheia de planos e com a vida pela frente. Sou apenas uma garota que perdeu tudo. Uma garota que olha pela janela imaginando como as outras pessoas se sentem com medo de me encarar.

 Não demorou muito tempo para que o que eu mais tinha medo me alcançasse e quando me alcançou não pude acreditar. Talvez bem lá no fundo eu talvez soubesse e só não conseguia me deixar ver. Pude ver claramente por alguns segundos tudo que eu me fiz esquecer. Toda a ideia errada que tive. Todas as ilusões que criei. Tudo que pensava ser minha culpa e nunca foi. Não de verdade. Me fizeram acreditar que era por mim. Que eu era responsável e eu acreditei porque não conseguia me lembrar. Não conseguia distinguir. Mas agora que eu me lembro só me sinto com vontade de seguir em frente. Deixar essas lembranças pra trás. Esquecer de quem eu fui antes, de quem fui por um tempo agora e ser outra pessoa. Uma completamente diferente da que eu queria de volta. Por isso me sento em um lugar diferente e não olho mais para a janela. Não observo mais as coisas, não imagino vida alheias. Quero pensar na minha própria. Eu sou apenas uma garota que precisa ir em frente. 

*Inspirado pela história do livro e do filme " A garota no trem" escrito por Paula Hawkins e inspirado também nos sentimentos de Rachel 

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